Quem é Irene?
Quem já passou dos 40, 50 anos, é possível que não tenha tanta desenvoltura no manejo do computador, principalmente, da Internet, mas nem por isso fica alheio às novas tecnologias e não são, nem de longe, os conhecidos analfabetos digitais, informáticos ou cibernéticos. O que se vê, na verdade, são muitas dessas pessoas a navegar nas redes sociais ou a fazer da Internet uma potente ferramenta de trabalho.
Tive um pouco mais de sorte, porque iniciei, há alguns anos, ainda no tempo de bancário, minha inclusão informática e, hoje, por isso mesmo, tenho relativa facilidade no mundo cibernético. Entretanto, ainda dou minhas mancadas, principalmente, quando o assunto é bate-papo em redes sociais.
E por falar em rede social, resisti quanto pude para não me associar a alguma delas. Resisti, mas cedi à tentação. E, até o momento, não tenho do que reclamar. Usando-as com parcimônia e o devido cuidado, creio que não se tem muito o que temer. Cedi, portanto, aos encantos do “livro de caras” – numa tradução literal –, o tão propalado e conhecido Facebook.
Dia desses, “conversando” com uma amiga residente em Goiânia, digitava meus textos sem usar abreviações, mesmo porque não sei, e a tratar nosso idioma com relativo cuidado. No entanto, tive uma surpresa. Minha amiga, que se utilizava de palavras abreviadas e teclava descuidadamente, desabafou:
– ai meu Deus q vergonha… q mico to pagando… vc escreve td taum certinho… e eu aki catando milho… rsrsrs.
Tentei explicar para ela que não se preocupasse e continuasse a digitar do seu jeito, é que eu ainda sou do tempo dos cursos de datilografia com direito a diploma (tenho dois!), uma foto 5×7, beca e boina, e não aprendi ainda as “modernidades da comunicação”, via Internet. Mas não houve jeito. Ela simplesmente desconectou e eu fiquei a ver navios, desolado.
O que me restava, então? Corri atrás de ajuda, lógico. Procurei alguém que não conheceu a máquina de datilografia como eu, porque já nasceu na Era dos Computadores, dos celulares, e poderia certamente me auxiliar. Esse alguém foi minha filha adolescente, Lara, à época, com 15 anos.
Contei a ela minha história, que riu muito da minha cara, e me passou uma lista de abreviações e aquelas combinações de sinais parecidos – grosso modo – aos ideogramas chineses. Muitos deles são verdadeiramente criativos, outros nem tanto, como, por exemplo: dois circunflexos ^^ significam “feliz”; um sinal de igual, um apóstrofo e um abre-parêntesis ='( querem dizer “chorando de tristeza” ou, ainda, uma barra invertida, um ó minúsculo e uma barra \o/ expressam um “vivaaa!!!”. Só para citar alguns, pois há uma infinidade.
Além dessas combinações de sinais ou letras, Lara me passou algumas abreviaturas mais utilizadas: blz (beleza); vlw (valeu); S2 (coração); sdd (saudade); ado/ada (namorado/namorada), e muitas e muitas outras.
Agora, mais confiante, já me achando um moderno taquígrafo cibernético, entrarei em alguns bate-papos, e eis quem encontro, para minha alegria: Vitalmiro Matos, o Carranca, filho de uma conterrânea, de quem há muito não tinha notícia, agora, morador das Américas. Ao perceber que ele estava online, dei sinal de vida:
– Olá, meu querido amigo Carranca, tá onde, agora, figura? Como vai? – e ficamos ali, trocando palavras num infindo converseiro informático. Que maravilha!
Era noite, bem na hora do Jornal da Band, que estava a noticiar um abalo sísmico ocorrido na Costa Oeste dos Estados Unidos, no final de agosto de 2011, quando quis saber se ele havia sentido a terra tremer por lá.
– E aí, Carranca, esse terremoto que a Band está noticiando aqui, neste momento, aconteceu perto de você?
– Não, não. Graças a Deus, não. Só que tô indo amanhã para Carolina do Norte e tô muito preocupado é com Irene.
– Quem é Irene, rapaz? É sua mulher? Sua filha? Quem é essa figura?
– Não, rapaz, Irene é o nome do furacão – e tascou um monte “rs” e “kkk”.
Sem saber o que dizer, restou-me comemorar meu fora, minha gafe, “pagar meu mico”, como se diz modernamente, e continuar o bate-papo bem mais descontraído, a sorrir da minha ignorância ou desatenção, sendo mais ameno:
– Também, né, uma mulher furiosa dessa, quem vai querer? – não perdi a pose e mandei de volta outros “rs” e “kkk” – não sei quantos –, querendo dizer que dei uma estrondosa gargalhada, nem mesmo sabendo se é assim que funciona esse troço. Isto é, quanto mais “rs” e “kkk”, o sorriso vira riso, que vira gargalhada, gaitada, frouxo de riso… E sei lá o mais quê!
Despedimo-nos com outros tantos “rs” e “kkk”, prometendo a ele que o episódio certamente iria render uma comemorativa crônica, que agora estou a pagar-lhe com hiperbólicas gaitadas. E tudo mais, somente para desopilar o fígado.
Salvador (BA), setembro de 2011.